Naco de nome (homem)


Mauricio Salles Vasconcelos


Este é um trecho do romance Bráulio Pedroso (Novela da Noite), editado em 2018, aqui transposto em diálogo com o evento “O homem tematiza o homem”, organizado por Ana Paula Ferraz (em fevereiro de 2021) e incluído neste site (Seção “Encontros”).

O fragmento (numa recriação e remontagem) da narrativa citada se relaciona ao debate ocorrido quando da reunião de MSV com os escritores Felipe Souza, Lucas Miyazaki e Marcelo Ariel para uma reflexão em torno do universo masculino na atualidade e da literatura produzida por homens. O homem tematiza o homem foi publicado em forma de ebook (São Paulo: Piscina Pública, 2021).







– Eu sabia que você gostava. Só não podia esperar uma localização tão direta.

– Tem partes em mim que só ele penetra. Eu tentei até com garotos. Lembra de Giuliano Ax, o protagonista de Galera Guru? Tão logo vi voo promocional para Nova York em época de baixa temporada, estava de graça. Não aguentei. Sabe Mag Mag? Abri pra ela tudo que sinto quando a gente se engata. Minha amiga se impressionou. Quis detalhes, como que querendo ver (e sentir) também. Engraçado é que a notícia se espalhou. Sábato jogou uma piadinha sobre minha viagem americana súbita. – O que foi que ele disse? – “Será que há motivos ocultos? Desses que nenhuma roupa cobre?” Ele estava ao lado de alguns integrantes da redação de Substituta, a próxima Novela das Nove, querendo ser ouvido com o comentário. Corei, no ato. Porque esse Seu Pau, Euniro, não apenas é grande, de um modo torto, estonteante, a crescer sem parar (dentro de mim, então, é uma loucura incapaz de ser sanada). Não paro de descobrir algo de muito íntimo a cada tocada. Mas não se trata só do que é meu e por isso vim, pois está com você e (a loucura a ser de novo, mais uma vez, confirmada) parece ser só coisa minha. Ou você não conhece o que tem? “Eu agora foi quem ficou corado”.

Surge um silêncio surpreendente. Nenhum de nós deseja falar mais nada. Kristielle/Kristeva descalça um dos pés. Sobe com a sola macia das unhas pintadas até alcançar o centro das minhas coxas. A garçonete do lugar se aproxima da mesa. Não vem para interromper nada, apenas pretende fechar a conta, pois há uma fila grande para conhecer o novo centro de atrações na altura da Bowery, com oferta amistosa de um cardápio bem sortido de diversas culinárias da Ásia (com preços bem abaixo do mercado). Não cessam de surgir países a cada menção aos pratos. Estou muito “ouriçado” para sair dali, não necessariamente com interesse de despir minha amiga boa de cama, mas siderado pelo ( ) que não conheço, logo à mão de mim e de uma testemunha irrecusável. Preciso desnudá-lo. De imediato. – Leilah nunca lhe falou nada? – Como assim? – “Dele”, do verdadeiro Niro Zaremba. – Não sou eu, então?

– Meu amor, essa parte será sempre desconhecida de você. O que não é o meu caso. – Bem, Leilah... – Você está fazendo agora regateio, é? Se não quiser tirar a calça, eu avanço pra já (Depois você costura, tá?) Veja só uma pantalona de garage sell com botão! Você me leva amanhã nessa Liquidator depois da gente gozar muito?

– Muito ao contrário, Leilah nos últimos anos do nosso casamento me levou a um verdadeiro jejum de cama. Eram tantas nossas afinidades e atividades (sempre aquele conjunto perfeito de dois), que o sexo se evadia. Quando eu podia notar, tinham se passado meses a fio na solidão (na escora de uma união modulada por décadas adentro). Ela é quem queria me procurar, só se fosse assim (cada vez mais distante do “tal”, que eu tenho). “Não há certo nada de nada entre a gente”. Quanto mais o tempo nos unia. Minha mulher não se cansava de falar.

– Isso, replica, conversa bem irritado sobre Leilah, a “mulher de toda a vida”. Aquela que levou toda uma vida (a sua e algo a pulsar cada vez mais à parte). Vou matar sua fome, o jejum forçado. Adoro ver ele crescer enquanto me roça os lábios. Maior do que antes. Um verdadeiro taco americano. Muito prazer, parece que eu nunca te conhecia, meu adorado tasco. Além da curva que você (?) faz, tem pinta de chapeleira mexicana. Ah, por falar em pinta, e esse sinal preto por cima da cabeça? Isso dá pra você ver, né? (...) Nossa, nem precisa me responder mais nada! – Só não se esquece que quero fazer o mesmo em você. Ah, você não deixa. Gosta de agarrar, hein? Quer levar pra casa, guardar bem lacrado (todo “seu”, inteiramente brasileiro). Ai. – Só vou fazer essa interrupção pra dizer que essa breve temporada está sendo dedicada ao seu “ ”. Vim lhe fazer essa homenagem num voo rápido, promocional. Daqui a dois dias já estou de volta para o Núcleo TeleSSérie do Jardim Botânico. Espera. Vem novamente (dá pra sentir por inteiro, dentro da roupa). Você. Você é todo meu. Vou deixar de te chamar de Niro, ok? – Vou inventar um nome todo meu, só pra mim, chamando o que está em você, mas só se encontra na minha mão. Principalmente, quando sei a fome que Nick passou.










– Nick?








(Naco de Nome)


– Sim, pra não ficar tão longe de você. Sendo outro, porém. Like a nickname. Ou talvez Nico. Assim, só troco uma letra do seu apelido (Niro) original, e ainda brinco com uma forma feminina escondida sob o prenome de homem – algo que está aí, mas se dá pelo avesso, like an underground. On velvet. Eu falo nisso porque a rua muito me inspira. As coisas sempre acontecem aqui nos arredores do Pamela Café. Todos estão em busca de muito sexo quanto mais se vestem de beauty, chamativos adornos recém-surgidos. – Fashion City. – Vai se recuperando aí com seu moka, porque vou aproveitar que estamos na Broadway e comprar calças bem apertadas. – Como assim? – Não é pra mim. Nem pra você. Em nome de Nico, isso sim. Tenho algo a dar (o que) de comer. Ah, ah, ah. Niro atuará como simples modelo. A ponto de estourar o cabeçote dentro de uma saint-tropez de couro puro. – Estou achando interesse seu jeito de me tomar por inteiro, quer dizer, sem me considerar, focando apenas uma parte (como se fosse o eixo de tudo, sem ter nada mais comigo). – Nunca pensei que a Cidade-Centro do Desastre de nossa Era me levaria a prazeres tão imediatos, colhidos de um pé de coxas tão antigo desde os ares de escola. Desde quando se chamava Guanabara o que hoje nomeamos apenas a Baía; bem onde iniciamos essa trepação, com intervalos, pra recomeçar com toda força de arremesso mais língua macia receptiva em cada dobra. Tudo que é veia e esguicha.


– É aí que eu te amo cada vez mais. Deixa meu talo na seca. Ferida falsa: vermelhidão viva. Na verdade, você nunca foi esquecida. Nossas tardes cariocas foram matrizes do que eu iria viver. Kristeva, quem diria a garota-apelido (tarimbada em semióticaliteratura pelos signos de Julia K, a bela búlgara em franco exílio francófilo) na Av. Chile, Faculdade de Letras (Centro Velho de uma capital chamada de Rio). Vem agora até aqui e dá um nó bem no meio da nossa vida. – Adeus, Niro Zaremba.

Ou melhor: olá, bem meu, nem preciso de cerimônia, nenhum cumprimento. Vamos colocar umas calças colantes por cima disso tudo. Já acabou seu moka? – Já estou siderado. No ponto. Vamos ainda hoje ver Yvonne Rainer no museu pro lado das docas? – Depois de nova rodada, certainly. Parece que parei na rua 6, debaixo de cheiro de curry, dentro de seu quarto-armário. Ninguém viaja, assim, pra ficar internada. Logo aqui. Ei, este não é Vincent Gallo, passando ali na outra calçada?

– Não, não, é um puta clone. Está observando? O cara aproveita a semelhança com Gallo para distribuir panfletos. Agora, que ficamos olhando, vem na nossa direção. – Thanks. Quer ler a filipeta? Eu não acredito. Um convite para integrar um filthy film. Estão recrutando agora, quem bem quiser ir. Fiquei besta!! Vou aproveitar isso na Novela. Transporei a cena para Rio by nite. – Você não quer entrar nesse filme? Agora comigo? As duas garotas magras vão topar. Não parecem, mas são homeless. E o mais assustador: chegam a doer no desejo de tão lindas.

Gallo já vai levando as duas pela mão.


E aí, Kristeva, como é que ficamos?

Onde?

– Estúdio – Ap – Na boca das Docas.

Fiquei de ver um amigo ligado em vídeo-escultura, que tem um loft-usina-de-produção em Chelsea, mas maloca oxi na contramão pra sobreviver debaixo da fachada. Pode ser bom. Ele é descolado em tudo de Arte-Cidade-Sites Sortidos e acabará nos passando os programas imperdíveis, além de algum aditivo. Mas antes vou lhe comprar uma calça-de-couro.

– Pra mim mesmo, como se fosse um presente de namorada? Ou só vou usar no dia de hoje?

– Só pra “ele” e apenas hoje.

(Com o passar das horas e dos lugares que nos unem,

As horas e os lugares passam por aqui

Depressa demais:

Cada segundo/Cidade dos desejos onde

Tudo se abarca imediatamente logo eva-

Poro assim também tão veloz “você” por

Inteiro/

Você não mais é um pertence.


Você não mais se pertence,


Nem mesmo a mim) – Começo a

Preparar viagem de volta,

N.